sábado, 28 de fevereiro de 2009

28/02/09
the cranes
foi brutal, bonito, bizarro.

sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

é um brilho de água. uma coisa difícil de explicar. algo de confortável que te atravessa o corpo e te puxa para um tempo indefinido. não tens garantias de nada nunca de verdade. podes dedicar-te ao sonho e a uma qualquer vontade luminosa. queres voltar a escrever poemas. hás-de escrevê-los. pensas demasiado na vida que não tens. de que é que tens medo? entre o medo de um pouco mais que nada e um pouco menos que tudo. tens de dormir agora. tens de dormir. embalado com a respiração. dorme bem. dorme bem. dorme.

quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

cinco!!! cinco!!! cinco!!!

ontem vi a maior malha da minha vida em termos futebolísticos. uma lástima. um desastre. fiquei abananado a seguir ao jogo. nem sabia onde estava. é um resultado que ficará para a história destes sacanas. eu sempre tive as minhas dúvidas em relação ao futebol do Paulo Bento, não se sabe muito bem às vezes o que quererá ele provar, mas enfim... é ele quem lá está, é ele que tem de fazer o seu trabalho. agora, isto deixa-nos é numa situação que tem de ser resolvida e pensada: na Taça de Portugal já não estamos, na Europa já não estamos, a Taça que ninguém respeita é o que é... só nos resta o campeonato... é difícil, mas é o que nos resta, estes gajos não podem andar a vida toda a lutar por um segundo lugar, precisamos de ganhar este campeonato. este fim-de-semana vamos ganhar ao FCPorto. temos de lá ir ganhar. temos de limpar a imagem. se não for assim... mais vale irem já de férias e alguém terá de começar a pensar na sucessão. detesto jogadores que não deixam tudo no campo. é como os actores. detesto actores que não deixam tudo no palco. não quero cá saber de poupar jogadores, que poupar? é o trabalho deles. estou enervado e só me apetece dar chapadas a alguém.

quarta-feira, 25 de fevereiro de 2009

só há um mundo.

terça-feira, 24 de fevereiro de 2009

é a voz que te diz a verdade. estás morto. distante e morto. pior do que ela não te amar é não fazeres parte da sua vida. os teus olhos têm ferrugem. andam constantemente húmidos. sentes-te insuportavelmente surdo ou mudo ou cego, não interessa, sentes-te como te sentes. afastado da casa. a ver a casa na distância dos dias e levemente possuído por pesadelos autistas. andas na rua sem tocar no chão como se estivesses com uma ressaca fodida. ela não te quer para si. não lhe pertences. não és seu. tens uma língua estrangeira possuída por demónios. já não podes falar sem raiva e sem ressentimento. não perdoas nada. um mar de vazio. olhar de vidro. a casa vermelha tornou-se numa casa incendiada. negra de fumo. bem me quer, mal me quer, não me quer. falta-me o quê para ser possível? não tenho o quê para ser humano? cria-se a bola no estômago que procura o rebentamento precoce das manhãs. as manhãs solitárias. envenenadas. se fossem lágrimas de fogo as que escorrem neste rosto marcado do tempo atiraria-as contra os teus cabelos. chorar-te-ia mais do que mereces. já não sei o que mereces. choro porque não o mereces. vomito porque não o mereces. sofro porque não o mereces. sempre foste virado para dentro. estou a falar para mim. possibilidade esmagada e esventrada. estatuto estranho. decomposto. descomposto. vergonha viva nas horas e nos dias. no cimo da montanha gritaria a todo o mundo para me sentir vivo. atirem-me com toda a treta aos colhões e não me cantem canções de embalar que eu estou farto de dormir. insuportavelmente raivoso. cão. lixo. ferrugem. vazio. cheio de merda na cabeça. deitem fogo ao desabafo enquanto ele está vivo. assim apaga-se o menino. já não há menino. o menino foi-se embora. desnasceu. rasgar a carne com as unhas. arranhar-se enquanto se toma banho para tentar limpar este vazio. chora cabrão chora. chora mais. chora que isso limpa. chora que isso limpa. sai. vá. sai de dentro. escorre. arde. sai. desaparece. eclipsa. apaga. segue. as marcas são o que são. ficam como ficam. valem o que valem. há razões que valem menos que os despojos de um combate, é que por muita glória que se procure, há muitas maneiras de chegar à paz, ou à segurança, ou à estabilidade. estás na hora de saltar. não pertences ao seu mundo.

domingo, 22 de fevereiro de 2009

a primavera é muito gira. eu gosto muito da primavera. na primavera é tudo muito bonito. é só flores. namorados. passarinhos. alegria. criancinhas. quadradinhos. mas as putas das alergias... dão-me um asco... os pólens... umas ânsias... era correr tudo à bolachada. malditas árvores e plantinhas. ó tempo macaco. é tudo a tirar a roupa. tudo a namorar no meio da rua. e um gajo a fungar do nariz. enfim... só alegria? não, só alergia!!! tempo levado do diabo.
pronto, ela talvez te ame e só não te diga.

sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

a primavera está aí à porta, com o pólen, as criancinhas, os namorados, os carinhos perdidos na rua, as hormonas, os passarinhos, etc... etc... não há nada mais insuportável. nada mais insuportável que essa felicidade da temperatura, esse mundo temporariamente perfeito e belo e amarelinho, enfim... o que isto tem de bom é que chega o verão e dá para ir à praia e apanhar escaldões. maldita primavera. é só alegrias, só alegrias, pessoas simpáticas, pessoas que se riem sozinhas na rua depois de noites de amor, um vómito. a primavera dá-me asco. se tivesse um bastão... ai, saía com ele de casa e juro-vos, se encontrasse alguém a namoriscar no meio da rua... ai levava, ai pois levava, era um enxerto de bastão, com estas ânsias, e esta ausência que me morde a cabeça e não me deixa dormir descansado, é que eu gosto de dormir. se arranjo um bastão... é saírem da frente, que lá venho eu... armado em punk, a esmagar pombas pragas, no meio das criancinhas, nos parques infantis... criancinhas... amor... quadradinhos... que nojo. primavera maldita, que só pode estar feliz quem a vive. e não me estou a queixar. mas se arranjo o taco... é à tacada!!! à bastonada!!! zumba por aí fora!!! chegue-se para lá ó casalinho.

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009


auto-retrato 29

olha, sou como o tempo, às vezes chovo e outras vezes faço sol. mas é assim que o mundo gira. e se não houvesse chuva não haveria o prazer da luz quente. é claro que sou limitado. não abarco mais do que a minha vista alcança e tenho um olho que vê bastante mal... já dá para imaginar o que alcanço com o olhar... pouco ou nada. os cegos vêem para dentro. enfim... é melhor deixar-me de pesadelos, mas o que é que se pode fazer quando não se tem o hábito de recordar sonhos? as coisas são insistentemente cíclicas.

quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009

Às cinzas

Nem todos na aldeia me olhavam com bons olhos. Perfeitamente normal. As pessoas são enigmas. Apesar de tudo conseguia ter uma vida regular e era até bem aceite em certos círculos. Os problemas começaram quando me apaixonei pela filha do Governador. Sou de famílias humildes. Nunca fiz nada para ocultar isso, nem vergonha, nem orgulho, o nascimento é um acaso. A filha do Governador aterrou na minha vida da mesma maneira que eu certamente aterrei na dela, como uma explosão louca de realidade. Estava eu na altura a passar por uma das muitas crises que me acompanharam sempre. Acabado de sair de uma desilusão sangrenta, andava meio apático, incapaz de rir ou de chorar, com uma vida quase nula. A filha do Governador. A tal que brilhava no meio das suas amigas. Filha única, protegida como um tesouro, a jóia mais preciosa da sua casa. Eu, o rei de todas as incoerências, magro, músico de rua das cidades distantes, batido da vida, mal vestido. Quando a vi fez-se luz na minha existência. Comecei de repente a acreditar em coisas. Na aldeia era muito difícil encontrar as pessoas, só os velhos e os alcoólicos frequentavam as tabernas. Só no Domingo na missa se podia encontrar o povo. Cada família tinha a sua fila marcada como os lugares numa sala de aula. Era assim. Natural. Eu nunca ia à missa. Passei a ir. Passei a ir todos os Domingos ao lugar onde todos se viam. Olhava-a de longe. Não tinha tido ainda a coragem de lhe falar. Estava decidido a fazer contacto mas o medo impedia-me. Fechei-me em casa dos meus pais durante três dias seguidos. Escrevi milhares de cartas que rasguei. Mas houve uma. Uma só carta que guardei. No Domingo seguinte, a missa. Esperei que todos se levantassem na altura da comunhão, fui até à sua bolsa, atirei com a carta lá para dentro, desapareci. Nesse dia, a minha cabeça revolveu-se com ansiedade e com vergonha, mas a carta estava entregue. Seria a primeira. No Domingo seguinte a mesma coisa. E no outro. E no outro. E no outro, estou eu a meter a carta na sua bolsa, olho para ela, ela olha para mim, tarde de mais, a carta está lá dentro e eu estou desmascarado. Ela ri-se. Eu devo ter-me tornado de um vermelho fogo. Que momento. Não voltei a ir à missa. Fiz-lhe chegar mais uma carta através de uma das suas amigas e voltei a entregar-me à vida parva das tabernas com fugas constantes a cidades diversas. O tempo passa. Lembro-me que chegou um Verão. O Verão. Voltei para a aldeia. A propriedade do Governador tinha um lago onde a sua filha e as amigas se banhavam. Eu sabia. Também já lá tinha ido às escondidas. Ela não me saía da cabeça. Aquele sorriso que me tinha batido daquela maneira. Tinha de voltar a vê-la. Tinha de falar com ela. De estar com ela. Beijá-la. Senti-la de perto. Entrei na propriedade do Governador e fui até ao lago. Fiquei de longe a olhá-la, rindo-se no meio das suas amigas, com o seu brilho de sempre. O meu amor, primeiro e único. Nessa noite chorei e tive uma insónia adolescente. Não conseguia comer nada. Os meus pais estranhavam. As minhas entranhas consumiam-se de uma forma devoradora. Era um fogo. No dia seguinte voltei ao lago, aproximei-me e chamei-a. Ela veio até ao pé de mim enquanto se tapava. Chegou. Agarrei-lhe na mão e disse-lhe: amo-te. Meu deus. A mais absoluta das verdades. Amava-a. A filha do Governador. Um amor impossível como o amor dos grandes livros. Um amor cavalgante, total, incendiado. Amo-te. Uma expressão já demasiado batida mas que eu sentia com o corpo inteiro. Ela ficou nervosa com a minha confissão. Foi um impulso. Dei-lhe um beijo na testa que foi mais roubado do que consentido, disse-lhe: amanhã a esta hora estarei aqui, preciso de ti como o mundo precisa da luz, não me lembro de ter momentos em que não me visites tudo o que sou, amanhã a esta mesma hora, amo-te, amo-te, amo-te. Virei as costas e fui-me embora. Uns apertos no estômago e umas turbulências na cabeça. Não importava, nada havia a fazer. Teria de estar ali no dia seguinte com toda a verdade que possuía. Sempre reagi por impulsos, uns foram bons e outros nem tanto. O primeiro impulso de ir ter com ela tinha sido fácil, relativamente, mas e o impulso seguinte, o impulso já não impulso??? Esta foi a minha maior noite de angústia. E falo de muitas noites de angústia que me acompanharam sempre, em que estive solitário, angustiado e comigo mesmo. Esta foi a noite que me meteu mais medo. Comparável a esta só a nossa primeira possibilidade de amor. Nesta noite não dormi. Saí para a rua de manhã e acompanhei o despertar dos pássaros com uns cigarros. Inventei poemas na cabeça. O tempo do amor... Nem tinha ainda bem a noção das consequências que estes tempos haviam de ter mais tarde. Não importa. A luz era eu quem a tinha, amava a mulher mais bela de entre as mais belas, tinha o meu tesouro, a sua família possuía uma jóia mas o amor amor era o meu, só eu é que a queria daquela maneira, era eu que lhe pertencia. Fui no dia seguinte com um medo que não era bem um medo, era um receio absoluto de falhar, queria apenas falar-lhe, dizer-lhe tudo, despir o pensamento, se é que o havia, mostrar-me todo, era isso que eu queria. Corri para o lugar combinado, encostei-me a uma árvore e esperei um pouco. De repente chega ela. Linda. Branca. Luminosa. Chega como quem não sabe ao que vai. Eu mordo-me de medo e de fascínio. Assim que me vê pára e não diz nada, fica imóvel no meio do verde. Tenho de ser eu a falar. Detesto falar. Sempre detestei. Mas ali tinha de ser eu, era eu que desafiava, eu e o meu impulso medroso, éramos nós que tínhamos de assumir o primeiro passo. Olho para ela envergonhado, roo-me por dentro, mas avanço na sua direcção, digo-lhe alguma coisa sem sentido nenhum, e caminhamos. O caminhar foi a minha salvação. Eu queria dizer-lhe que a minha vida era dela mas isso foi impossível. Caminhámos um bocado até que fizesse um círculo e estivéssemos no mesmo lugar em que tínhamos partido. Aí sim, era necessário dizer alguma coisa forte, mas o quê? Não me vinha nada à cabeça, tudo era amor e quadradinhos. Tudo era perfeito. Ela ao meu lado por entre as flores, os pássaros que cantavam, o riso das raparigas ao longe, tudo era poesia. Maldita poesia. Sempre a odiei. E agora? Que lhe vais dizer? – perguntava-me eu sem saber que resposta havia de dar-me. Chegou a altura e mandei um: quando voltamos a ver-nos? Ela sorriu um depois. Foi cada um para seu lado embora eu tenha esperado vê-la desaparecer por entre as árvores. Encontrámo-nos mais umas vezes comigo a raptar a sua tranquilidade do lago com as amigas, era assim que estava instituído, seria eu o criminoso. Um dia depois de mais uma volta roubei-lhe um beijo que ela não deixou que fosse roubado, foi um meio beijo. Nesse dia fui para casa a correr e tudo me fazia uma certa confusão. Era como se desconhecesse tudo. Pensava naquele momento como se fosse o último momento da minha vida, engano puro, só queria era estar lá no dia seguinte. Os enganos da idade. O Verão acabou. O lago ficou frio. Nem amor nem amigas de amor. Uma tristeza à flor da pele. Deixámos de nos ver um tempo curto. Um dia estou eu no meio da rua e vem ela na minha direcção. O medo cá dentro. Ela acompanhava a minha vida de uma maneira louca. Só sei usar metáforas até certo ponto. Um dia, num outro Verão mais real, vamos os dois até um lugar, um passeio no início, sentamo-nos e falamos de coisas, os dois no chão de cimento, beijamo-nos. Eu troco juras reais e eternas por algo que não sei o que é mas que quero demasiadamente. Beijámo-nos sem limites de um e de outro e juntámos as mãos. As mãos. Mãos que me fizeram perder para sempre num mundo de fantasia e de sonho. O tempo passa sempre sem que se repare bem nele, simplesmente passa, nada de estranhar. Acompanhámo-nos durante uns tempos, quase que pegados pelas mãos e por momentos absolutos. Nada pode ser perfeito. O consentimento. O Governador. Homem cinzento como todos os homens que perderam a felicidade. Eu era apesar de tudo livre. Eu sou, apesar de tudo, livre. Que se acabem com as metáforas, vivo agarrado a coisas mas não tenho medo de ir lutar por uma causa que me diga algo, sou um romântico do mundo imperfeito, vivo num tempo de caos e também o sinto em mim, posso fazer o quê? São assim as coisas, todos já quisemos fazer crimes loucos por coisas impossíveis. O Governador teve conhecimento dos nossos encontros de uma maneira que ainda hoje considero ridícula, eu não quero falar disto, já não me interessa falar do Governador, só quero falar da sua filha, mergulhada no medo de não cumprir o sonho que lhe tinham criado, a filha do Governador foi perdendo o seu interesse pela minha loucura, o que é normal, é bastante normal, não tenho onde cair morto, quer dizer, morto caio em qualquer lado, as pessoas já não vivem para o amor e uma cabana, o mundo já não lhes dá tempo. Tenho dores constantes com a impossibilidade. Eu não me importo de ser um simples aprendiz de feitiçarias, é-me inevitável, e por muito que queira mudar a minha vida para a tornar possível... as feitiçarias vivem aqui. Já desisti de lutar com as feitiçarias, tive de as aceitar como naturais. Ora quem é que pode explicar isto a quem te pede o impossível? A quem quer que mudes a pele, está bem que é mudar a pele por uma causa maior, mas não seria melhor haver umas cedências de parte a parte? Eu acho que sim, mas há pessoas para quem isso não é normal. Os governadores deste mundo. Na verdade, não sei quem quererá um mundo melhor, todos construímos a desgraça nossa e alheia. É o a culpa não morre solteira. Enfim... o Governador começou a exercer uma certa pressão que me deixava bastante revoltado, claro, devorador de sonhos, a pressão que desconhece a diferença só me pode revoltar. Problema nenhum, não deixámos de nos ver durante anos. O tempo pode reagir de várias maneiras, nem todas são boas, são o que são. Fui esgotando possibilidades que na verdade nunca tive. Chega a uma altura que tens de mudar alguma coisa no desenvolvimento da vida. Vais abrindo portas que te façam aproximar do que pretendes, anular distâncias, isso nunca ninguém reparou, sempre que abres portas fechas portas, o mundo funciona assim, chega a uma altura que estás próximo mas sem portas para abrir. Tens de partir, voltar às distâncias. Vais para outro país com duas malas, uma tem roupa e outra tem sonhos, deixas uma parte de ti com quem amas e nessa parte ninguém toca, acreditas sempre num regresso, mas as distâncias são tramadas, as distâncias e o tempo e a ausência. Não sei se as pessoas crescem com o tempo, mesmo que não cresçam, o que é certo é que se desenvolvem e chegam ao ponto em que não há regresso, as alturas decisivas da vida. A filha do Governador começou também a exercer pressão, mais pressão do que apoio. Só te dizem que tens de resolver a tua vida, tens de resolver a tua vida, mas e o que muda na de quem te diz isso que te dê um sinal de claridade? Muito pouco ou nada, ainda te encontras com medo que o Governador descubra aquilo que já todos sabem, que até ele mesmo sabe. Tudo isso cansa e deprime, parece que tens de resolver a tua vida para fazer a vontade ao Governador, para poderes ser apresentado na sua casa com tranquilidade, isto tira-te qualquer dignidade que possas ter. O mundo é feito de diferenças. Não estou a desculpar a minha conduta. Eu sei muito bem da minha loucura, eu sei muito bem o que quero fazer, só não sei é neste momento como fazê-lo, está dito. A vergonha sou eu quem a tem, a filha do Governador podia muito bem estar descansada, ela sabia o que tinha. Começou a atirar-me com a expressão vítima, a expressão que mais me incomodou em toda a minha vida, eu não me faço nem fiz nunca de vítima, há contextos para tudo, e há alturas em que tens de tomar decisões que sabes que são erradas, e tens tudo para ser feliz de acordo com as normas da moral e dos bons costumes e da honra e do orgulho, mas mesmo assim cometes erros impensáveis porque a tua felicidade não passa por aí, nem tu sabes por onde passará ela, mas sabes que não é por aí. Andas à deriva por continentes alheios, não sabes muito bem onde te metes, mas metes-te e a partir do momento em que lá estás... deixas ir. É o resumo da minha vida. Não há vitimização nenhuma neste ponto e estou-me nas tintas para quem me programou uma vida, não acredito em coisas divinas e a imagem do sofrimento andam muitos com ela pendurada no pescoço, é a tradição ocidental, a educação. Houve um homem que sofreu muito e no fim morreu para nos salvar. Se estivessem era calados quando metem isto na cabeça das criancinhas mais lhes valia. Pois a verdade é que eu amo a filha do Governador, nunca deixarei de amá-la, há crimes pelo meio mas a minha vida é feita de crimes, não tenho a visão romântica do criminoso, é o caminho natural de alguns, perpetuar crimes, procurar sonhos, dois lados da mesma moeda que na verdade chega ao final e não vale nada. Quanto menos possibilidades eu tinha mais o seu desencanto aumentava, quanto mais o seu desencanto aumentava mais eu me afundava nas minhas lamentações tontas e no meu suicídio lento, vida de tabernas, poesia derrotista, digamos que vivia mais intensamente o caos do mundo e só me comovia com a felicidade, com a felicidade e com a beleza, já não a vivia, já me bastava, era-me suficiente que a partilhassem comigo, a felicidade que cada vez mais tinha a certeza que não iria viver, a beleza que cada vez tinha menos capacidade de construir. Já não tinha impulsos. Quando os tinha deixava-me ficar quieto a meditar possibilidades negativas e não conseguia reagir ao caos que se instalava na minha cabeça a cada instante. Era o meu problema. Estava longe e não estava inteiro. Eu sabia isso com tudo o que era. Mas o regresso era ainda impossível. O Governador não estaria ainda pronto. Todos temos desafios na vida. O meu era chegar ao ponto em que a filha do Governador se pudesse orgulhar de mim, mas quanto mais procurava isso mais distante parecia do seu orgulho. Talvez esse orgulho fosse realmente impossível. Nunca pretendi ser um comerciante de ilusões. Era assim, músico das ruas, procurava tocar nas pessoas com o meu canto de angústia, por vezes conseguia, por vezes não, mas era esse o meu caminho, podia afastar-me dele mais ou menos tempo, mais ou menos vezes, mas era lá que voltava sempre. Desde pequeno na aldeia que tinha sentido esse impulso, aprendi música nas tabernas e queria estar sempre ao pé dos grandes que metiam medo aos pequenos. Depois comecei a abrir o meu círculo de acção e passei a ir a outros lugares, cidades, países, pessoas, amigos. Gente que me mostrou livros e outras músicas. Voltei sempre à aldeia com a companhia dos livros e o meu interesse pelas tabernas passava apenas por um hábito alcoólico e por uma necessidade louca de tabaco. Havia de fazer o quê? Era um perdido, perdido não, um desencontrado, a quem tinha acontecido o melhor e o pior que poderia acontecer a alguém assim, apaixonar-se pela filha de um Governador. Se fosse alguém mais próximo de mim certamente compreenderia a dificuldade e seríamos uma equipa, duas pessoas lutam sempre melhor do que uma, acho eu, desde que não lutem entre si por questões de poder, desde que formem uma equipa blindada, que não se exponha à erosão do caos do mundo. Com a filha do Governador descobri realmente um lado absoluto da vida. O meu corpo crescia. Eu sentia-me gigante. Mas e quando chega a altura em que tens de pedir vida? Aí há algo que morre ou que adormece fundo nas coisas, a tristeza instala-se, não te deixa comer nem fazer nada, são os sintomas da paixão mas com uma causa diferente, a maldita tristeza. Chegar a esse lugar em que sabes que a perdeste para sempre, e que talvez o facto de nunca teres ido a casa do Governador na companhia da sua filha não seja uma questão de vergonha, seja uma questão de nunca se ter acreditado realmente na possibilidade, e tu sempre teres no fundo sabido disso. Há neste ponto uma derrota que te deixa marcas profundas, aqui é quando deixas de acreditar em ti. Porque realmente o facto dessa ausência de laços ao fim de um tempo deixa de ter uma explicação que seja plausível, quando tem de haver luta é porque tem de haver luta, não se pode fugir para sempre ao inevitável a não ser que não seja inevitável, e que se der para o torto queiras manter uma qualquer fachada que não provoque instabilidade nos alicerces sociais familiares, afinal de contas um Governador é sempre um Governador e um criminoso será sempre um criminoso, por muitas redenções que tenha e mesmo que já não pratique crimes, a história não se apaga, tem é muitas interpretações. O tempo ia passando e eu ia-me sentindo cada vez mais velho, é preciso dizer que eu não era ainda velho, era apenas como me sentia, tinha um apelo por dentro que me queria fazer regressar e agarrá-la e lutar com o Governador, fazê-lo chegar à conclusão óbvia que não podia mudar a vontade da sua filha. Mas ao mesmo tempo que sentia este apelo cada vez sentia mais o medo de que a vontade da sua filha fosse cada vez menos a minha, que ela quisesse uma vida tranquila e não uma vida absoluta. Uma vida absoluta é um risco que nem sempre corre bem. Uma vida tranquila nunca corre bem, vai correndo. Mas eu também queria ter uma vida tranquila, mas não conseguia. E o apelo cá dentro que se ia tornando um grito mudo, uma angústia de querer partilhar coisas que não podia, porque se voltasse não podia voltar para o pé dela, teria de inventar outra vez um processo de diminuição de distâncias, de abrir umas portas e fechar outras, nunca nada podia ser claro, voltaria, e continuaria tudo na mesma, debaixo das barbas do Governador, tudo por assumir, sem provocar safanões nos alicerces da família e sem baixar um qualquer estatuto. O que é um estatuto? É uma fraude. Não há estatutos neste mundo, há pessoas. Pessoas diferentes. Ninguém sabe se o problema está no crime ou na sua definição. Voltando ao tema do regresso. Regressar para quê? Era uma altura difícil a que se vivia na aldeia, regressaria para fazer o quê? Para me enfiar em casa dos meus pais? Para me voltar a dedicar à vida parva das tabernas? Para me tentar tornar numa pessoa conhecida às custas do meu trabalho suado, num músico de renome? Eu não era assim, eu era músico de rua, era isso que me dava sentido!!! O apelo era portanto reprimido. Contrariava pela primeira vez na vida um impulso que tinha, um impulso gigante, um verdadeiro grito que me podia voltar a fazer sentir vivo mas que eu reprimia até me esquecer de mim. Não sabia muito bem porquê, talvez por um medo terrível de que chegasse lá e nem sonhos nem realidade, a filha do Governador tinha o seu plano de vida e esse plano não contemplava imprevistos, ora eu... o rei dos imprevistos, com um trabalho de imprevistos, com uma mão cheia de sonhos que apesar da minha pouca idade se iam tornando cada vez mais impossíveis, eu estava um tipo batido, ela continuava imaculada. As vezes que me atirei com a cabeça contra as paredes por medo de a ter de alguma forma conspurcado, de ter abanado o seu descanso. As vezes que me massacrei por ter olhado para ela pela primeira vez e ter reagido ao impulso de ter ido falar-lhe. As nossas vidas teriam sido tão diferentes, a sua mais calma certamente. Eu sou dos da luta, nada posso fazer contra isso. Mesmo hoje, apesar do tempo, não sei se lhe fiz bem. É que não tenho mesmo a certeza de ter-lhe feito bem. E massacro a cabeça. E massacro a cabeça porque do outro lado não vem nenhum som, só recebo medo, só há medo, só receios. É compreensível, já tive muitas possibilidades e já perdi as muitas possibilidades que tive. Já me enganei de mais. Mas é que quando tens o vício da luta no sangue é muito difícil controlá-lo. Tornas-te numa carta fora do baralho com a maior das naturalidades, já nem precisas de esperar, tudo se torna previsível, tudo se torna aborrecido, aprendes o lado negativo do jogo e consegues prevê-lo com uma antecipação louca de jogadas, mas só o lado negativo, só antecipas a visão da destruição, chega a uma altura em que nada te causa espanto, andas encostado pelas paredes a ouvir o som das casas e a perguntares-te se os que vivem dentro serão felizes e se são felizes como será que o conseguem. A culpa disto tudo é de onde nasceste, cada vez tenho mais certeza disto, quando és educado no caos é muito difícil fugir ao caos, podes ser capaz desde que sejas forte, mas eu nunca fui forte, sempre fui inseguro, fiquei com o pior do caos, pouca luz na infância, problemas reais demasiado cedo, o que estarei para aqui a dizer? Isto é tudo treta. A verdade é que compliquei a minha vida desde cedo, é só isto. Problemas na infância todos tivemos, os problemas da infância... esse vício horrível da psicologia. Os fantasmas da vida ultrapassam a infância, muitas vezes são frustrações da juventude, ou da idade já adulta. Eu não sou defensor das psicologias. À filha do Governador dediquei-lhe músicas, não lhe dei os presentes caros do mundo, dei-lhe bocados de mim. Rasguei-me pedaços. É natural, era a minha forma de mostrar que a amava, ela era a minha inspiração louca, aprendi uma sensibilidade que me mudou tudo com ela. Poemas de dimensão impensável. O seu nome nos meus olhos. Enfim... se o Governador acha que ela era ainda uma criança quando nos conhecemos é porque me achava já demasiado adulto, pura ilusão, eu ainda não sabia nada. Só depois me veio esta tristeza. Quando estava com ela tudo era perfeito mas quando não estava, ainda hoje é assim, parece que me falta vida, ando pelos lugares, bebo demasiado, toco sem inspiração nenhuma, acho que já não consigo tocar nas pessoas. Perdi um brilho que talvez não tenha tido nunca. Uma estrela que me guardava e me iluminava os caminhos no meio do caos. Porque eu também tinha os objectivos da tranquilidade absoluta. Eu também os tinha. E não sei quem destruiu mais quem. Ao fim deste tempo todo sinto-me completamente gasto com os desenvolvimentos. Não me defenderam. Já me estou a repetir demasiado. Amo uma mulher. Isto deveria bastar para ter uma casa e escrever livros. Isto deveria ser suficiente para ter crianças que te fizessem rir na manhãs com uma felicidade incrível. Amar uma mulher. Isto deveria ser o bastante para que o Governador baixasse as suas armas e conhecesse um outro universo. Espero que o fogo não nos faça arder na sua combustão lenta e dolorosa. Não quero ser queimado vivo. Quero acordar de manhã ao seu lado, com a sua cara de sono, branca, cheia de luz, quente, confortável, grande, a abrir os seus olhos limpos e a ver-me e a rir-se e a perguntar o que estou eu a fazer e eu a dizer que só estou a vê-la. E só vê-la já é tanto. Que nada disto seja incendiado pelo mundo. É que o mundo de vez em quando prefere pregar partidas a deixar que as coisas corram como devem correr. Estou a acabar com as metáforas, se eu e ela algum dia nos separarmos é porque este mundo é realmente impensável para ser vivido, é porque não é mundo para ter filhos. Ainda hoje escrevo cartas que não sei que resposta irão ter. Posso dizer que sou um escritor de cartas. Se pudesse viver de escrever cartas... não tocaria música em nenhum lugar do mundo. Continua provavelmente numa próxima vida...
ela não te ama.

segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

são 29, nem é muito nem é pouco, é o que é. 29 anos.

sábado, 14 de fevereiro de 2009

dia dos namorados. sim senhora. dia dos namorados. flores. bombons. corações. jantares românticos. sexo louco. sei lá que mais. insuportável. nestes dias se tivesse uma arma desatava a disparar contra as pombas que as velhinhas e os netinhos alimentam. maldita alegria. armas. armas contra a solidão. e a merda do telefone que não toca. que disfarce do caralho. é encher-me de álcool e andar aí pelas ruas a vomitar entranhas até já não ter orgãos. corpo ideal. nem necessidades, nem consciência, nem sentidos. ao menos é-se nulo porque não se pode ser de outra forma. dia dos namorados. insuportável. o telefone silencioso. vou mas é trabalhar e deixar-me de fitas. só querem é desenvolvimentos na fachada. cambada. devia haver também o dia das pessoas que sentem a falta. bem, na prática é este. e depois, isso do amor... está bem que o amor não sejam só alegrias, mas também... estas palpitações, as ânsias, o telemóvel, a internet, caralho caralho, uns gritos. e estou quase a fazer anos, vou ter de me destruir. é a fase da destruição física. quero lá eu saber do futuro. que futuro? o telemóvel silencioso. coçam-te os olhos com as unhas compridas. é até rebentar. vou mas é trabalhar. é o melhor. só ando a escrever treta. mas há pessoas que conseguem usar a metáfora. ó sorte macaca. corpo sem orgãos. o Deleuze que me perdoe este utilizar pessoal do conceito. mas isso é que era. não quero ser nenhuma máquina desejante. agora vou para a rua e aposto que é só gente com ramos de flores na mão. vai ser um cheiro insuportável no Metro. e ao fim da noite, quando estiver a voltar a casa... só namoradinhos pela rua e um gajo ali, no meio deles, que só dá é logo vontade é de sair sozinho e apanhar uma bebedeira . porque é que não me dão logo um tiro. que tudo me enfastia.

sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

gozar do tempo enquanto a inconsciência dura. enquanto a dor não te bate muito grave na porta. não é gozar do tempo. é na verdade aniquilá-lo. nos meandros literários diz-se que o tempo é uma pretensão da questão. nos meandros literários fartam-se de falar. fala-se e fala-se e não se chega a conclusão nenhuma. gozar do tempo e escrever. olha que vida mais coberta de ambiguidade. o tempo. recorrência ultimamente habitual na terminologia própria. sim. terminologia própria. é que passados uns tempos de captura ganha-se terminologia própria, para quem não sabe disso. ganha-se um combate dentro de muralhas individuais, só para quem não sabe disso. adiante. não quer dizer que alguma vez volte à realidade, não importa. importa sempre mas lá se segue na linha do pânico. sim, o medo é para as crianças, olha o meu lado parvo a vir ao de cima. a minha treta: comparar sofrimentos!!! é a mania da queixa, é insuportável. é estar num sítio e ver quem chora mais e ter-se a certeza de que a maior lágrima nos pertence a nós, é a NOSSA dor, uma dor que acabaria com toda uma vida. uma dor puta que nos acabaria com a vida mais a nós do que aos outros. estou desumanizado. tenho muitas culpas no cartório. tornei-me numa onda de crimes. numa vaga violenta e auto-destrutiva. numa máquina de guerra interna. é claro que tenho de me resolver. mas há sempre os que se vão abaixo dependendo da perspectiva de quem olha. e isso não quer dizer nada. as coisas devem ser feitas com amor. e o amor é inconsciente não é calculista. ora isso é uma doença no mundo hoje, neste tempo binário. nesta necessidade formatada de realidade. voltando ao assunto inicial, o assunto do gozar do tempo. pois faz-se o que é possível. às vezes sai fumo. às vezes a cama é quente. a vida é como o amor. posso dizer o quê? fazem-se mais frases sobre o amor que sobre a vida, ao menos aqui ponho os dois no mesmo nível, quero eu lá saber de ascensão aos céus. o meu problema é ter a certeza que o sistema binário quer a minha reintegração. quer que eu seja zero ou que eu seja um. mas isso é um aborrecimento terrível. o mundo binário põe-me nervoso. deixa-me sem saber o que dizer. e eu poderia dissertar horas a fio sobre vazios, poderia dissertar sobre movimentos do espírito se para isso estivesse preparado e se isso fosse a minha vida. ando a detestar o à queima roupa e preciso de momentos que se espalhem. balas que atravessam a carne e sangue que se espalha quente e lento sobre a pele que desce, que é curva de um corpo já morto. descoberto na estrada. no meio do escuro. com as luzes dos faróis. enquanto se aproximavam as rodas. mas o corpo já estava morto e não sentiu o peso. ao menos isso. o tempo realmente move-se. é instável. não o considero motivo de orgulho a não ser que se chegue aos duzentos anos!!! aí sim, aí realmente é obra!!! aí pode cuspir-se sem vergonha. mas não acho que seja o tempo a resolver as questões nem acho que o tempo traga realmente algum conhecimento mais específico, claro que isso o tempo próprio o dirá e quem me dera a mim ter surpresas. surpresas... meu deus... onde é que elas andam que não me passam na porta E NÃO ME ESTOU A QUEIXAR E NÃO ESTOU DEPRIMIDO NUM SENTIDO GRAVE E SIM SÓ ME APETECE FUMAR E BEBER E MUITAS VEZES MORRER MAS É PORQUE SOU ASSIM tenho esta forma de me expressar, caminho no registo que possuo. é a única coisa que é minha, só o meu registo é que me pertence. se quisesse dramatizar um bocado diria já que nem eu me pertencia, mas é que não me apetece, porque se me apetecesse... ai ia já, escrevia logo a treta dramática que pertence à obsessão estilística e etc e etc. preciso de voltar a começar a pensar em termos de espectáculo. não me posso esquecer. não me posso esquecer. mas é que a preguiça e a anulação são tão automáticas e aproximam-se tão rapidamente. já não sei onde vou. já nem sei onde quero ir. lá está o vício de poeta português. percebem? é que cai-se na cantiga do coitadinho por hábito linguístico e por referência estilística. é 3 vezes 7 vinte e um. a verdade é que se gostaram dos livros errados. é só livros de desgraças, um gajo gosta do ritmo, são lidos naquelas alturas e ouvidos com aquelas músicas... é assim. também tenho saudades de ler na minha língua. enfim. um texto perdido com carácter biográfico, mais uma vez.

se eu estivesse em Portugal... não faltava a esta festa!!!

bem, este vosso compadre foi finalmente à SaFa (Sagrada Família na linguagem de la calle). depois de pagar um preço louco e passar por um daqueles torniquetes lá subi eu a escadaria principal do Mamarracho. o Mamarracho é realmente monumental, aí tiro o chapéu ao senhor que o imaginou, o senhor Gaudi era realmente fora. agora, pontos de nervos: ópá, paga-se para ali dar a volta dos tristes, já vi andaimes mais giros em obras mais pequenas, ah sacanas... pagar para aquilo, nem se podia subir lá acima, isso é que fiquei enervado. mas pronto... lá segui viagem... entrei no museu da SaFa e aí lá deu para ver uns desenhos e umas fotos e umas maquetas, cenas giras, enfim... a SaFa é a versão catalã da Santa Engrácia. o Mamarracho, ainda por cima não deu para subir às torres, estavam fechadas!!! mas o preço da entrada era o mesmo!!! sacanas!!! é para os ingleses!!! ainda me enervei um bocadinho mas depois olhei para os desenhos e acalmei. aquilo tem pormenores que são realmente bem apanhados. olhem, a ver como acaba. e já agora, para quem diz que aquilo está a ser feito tudo à maneira antiga... isso é treta, aquilo é quase só betão armado!!! o Mamarracho, gostava de ver aquilo acabado, deve ser giro. bem, fui passear que já merecia e gostei muito. e aqui fica a minha composição.

segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

querido diário sujeito a interpretações,
abordo-te aqui de uma maneira um pouco formal embora de formalista só me considere na medida do minimamente experimental. neste momento desconheço-te as linhas que podemos chamar de força em termos de definição. enfim... deixemos estas coisas de lado, estou-te a escrever a ti, estou-te a escrever uma espécie de carta a ti, que és uma espécie de diário, e é assim que se começam os textos diarísticos no imaginário universal. querido diário. querido diário. estou com o cabelo maior em alguns sítios e cada vez mais nulo em alguns outros. as marcas do tempo são assim, infiltram-se e simplesmente passam, não querem voltar atrás, as porcas, não há nada a fazer em relação a isso. pois a verdade, uma delas, e mesmo assim pode ser uma verdade mentira ou ilusória, mas a verdade é que a pele muda realmente com este assunto do tempo, a pele e o cabelo, maldita carequice, mas capachinhos são horríveis e as carecas não se podem enganar e toda a gente tem medo que a descubram e eu já tenho medos que me bastem para saber que não a devo esconder. onde é que eu ia? ó diário, tu vai-me lembrando que eu às vezes perco-me em frases, acontece-me perder em frases, hei-de fazer o quê? mas olha, a falar sou um desastre, a falar e muitas vezes a viver, sou terrível a falar, a escrever esqueço-me disso, é mais fácil, sabes que a história do cu... que quem tem cu tem medo... é verdadeira e o meu cu que o diga que já muitas vezes sentiu medo. diário, chega de paleio. vou recomeçar.
querido diário sujeito a interpretações,
estou careca e embora pareça cansado, sei muito bem que hão-de vir bombas, autênticas bombas incendiárias, que hão-de ser vomitadas convulsivamente até ferir a garganta e sair sangue. estou a ficar careca e embora pareça que também estou a ficar morto ainda tenho aqui mão para me defender de um que não seja muito forte!!! diário, sei que sou muitas vezes bananasentimentalóidedepreaborrecidomedricascobardolasmerdasetcetc mas ando a tentar mudar isso, e ao menos seja dito esse facto, batem-me mas também levam. alguém vai ganhar e não vou ser eu, mas é mesmo assim, não somos todos feitos para ganhar. querido diário. hoje estou perdido no meio delas. das frases. mas não me apetece recomeçar.
sigo. não sei em que sentido ou linha de discurso. há um bloqueio com as palavras e os sonhos últimos apresentam um lado expressivamente freudiano, que sempre me enervou, mas realmente andam a pairar nas minhas noites imagens que me aborrecem, as famílias, deve ser da idade, cartas que escrevo ao dormir, é insuportável. sempre detestei Freud e a maldita escola da psicanálise, aliás, escolas no sentido de linhas... incómodo absoluto na minha cabeça. enfim... estava a falar dos sonhos que me andam a atarantar a mona ao dormir. de serem sonhos demasiado freudianos na formatação interpretativa da treta que nos impuseram no caneco do imaginário universal, e é a segunda vez que falo dele. imaginário universal. tenho visto um lado da família em incêndios do mundo, é estranho porque é o lado fraco familiar da vida, deve ser disso, com a tomada da consciência do caminho talvez se percebam melhor os obstáculos e nunca hei-de usar esse argumento para me defender, sou burro porque sou burro, a palmada que o médico me deu quando nasci para que chorasse tem pouco a ver com esse facto. sou burro e pronto. tudo a declarar. nada a desculpar. sou um burro com ânsias. e como tudo ajuda o pobre... sou muito burro e tenho muitas ânsias. o Freud é chato. estar careca deve ser mau em alguns dias de verão. o sol na cabeça é perigoso e o perigo, embora muitas vezes excitante, não é aqui agradável, saltar a pele na cabeça, arrancar bocados dela, uma seca que os protectores só ajudam muito minimamente e eu não os sei usar. sonhos atormentam-me. atormentam-me porque vejo coisas que não quero e espeto-lhes com a treta da formatação.
querido diário. tenho de ter cuidado. há coisas que mordem os calcanhares. a vida morde-se a ela própria. injecta-se veneno. é animal. detesta solidões. altera-se. quer subir sempre. diário. lembrei-me de um texto que escrevi quando tinha vinte e cinco anos que era sobre o facto de ter vinte e cinco anos. estou agora pior. menos ilusões e com visitas freudianas a atormentar o sono. não me apetece gritar mas apetece-me fumar. só me apetece fumar. já não tenho lata. só me apetece rir. mas rir à gargalhada, é o melhor. diário de interpretações. tem calma. escrevo-te a ti mas falo para mim. muitas vezes escrevo para lavar. não estou preocupado com exigências de leitores. isto vem assim. detestaria escrever estilos. gosto de escrever livre. prefiro não meter os meus textos em prateleiras. prefiro parti-los como pedras. sacar-lhes a forma. se só escrevesse o que interessasse aos leitores estaria tramado. não iria escrever quase nada e acabaria por deixar mesmo de escrever. isto é uma necessidade. não dá para orientar. isto não é um trabalho. ó diário. tu vê se percebes isto.
estás sempre a mandar-me à merda. depois os sonhos insistem. a saudade aperta mas a voz não soa. há a altura. lá está o pobre a ser ajudado. diário. hoje acabamos aqui.

terça-feira, 3 de fevereiro de 2009

E crescem as unhas do tempo sobre corpos falantes
Paisagens
Textos invisíveis escritos com o olhar
Era uma vez...
Em busca do passo seguinte da história
História pessoal
História do mundo
Depois do incêndio
Da peste
Da fome
Da guerra
Dos gritos e das lágrimas
Das revoluções
Voltar ao passo embrionário
Era uma vez...
Três
Mosqueteiros
Armados até aos dentes para combater a doença
Infiltrada nos corpos autistas das coisas
Que lutavam para impor a realidade
O crescimento das unhas
Do cabelo
A transformação da pele
Metamorfose
Envelhecimento
Desaparecimento
Luta
Lunar
Lacunar
Sujeito da história
Nulo no mundo mudo
Cinemático
Cantante surdo
Um sussurro esperado para continuar com ritmo
Sem o corpo desolado
Desamoroso
Desamado
Perdido
Encontrado
À deriva nos seus nadas
Em câmaras de eco
Câmaras escuras
Silêncio-silenciadas
Sem palavras novas
Sem paredes pintadas
Ou riscadas
Ou sacudidas
Elas
Despidas
Com as mão nos ferros
Com o ar quente na boca
No chão
Na água
Os anzóis
No ar
Os pardais
Os aviões
As nuvens
Os palavrões
As unhas crescidas na carne
Da carne
Regressam à carne
Outra
Ferida
Esta mais ligeiramente ácida
Fotografia de dedos molhados
Em busca de amor
Que é como quem diz casa
Que é como quem diz mundo
Que é como quem diz vida
Que é como quem diz sentido
Certeiro
O tiro
Matou o porteiro
A porta fechou-se
Ninguém mais entrou
Depois chegou o ladrão
Com os seus olhos no chão
A porta abriu
O ladrão entrou
A cantora cantou
E a mulher tossiu
Tossiu porque não quis o ladrão
Tossiu porque o ladrão era da droga
Tossiu porque o ladrão era um ladrão
Um ladrãozeco
Um meia leca
Desapossado
Despessoado
Desajustado
De auto-estradas
Linhas curvas
Como lágrimas
Intermitentes
Impressas
De fome e saturação
Em estado de vigília
Sem sorrisos oferecidos
De chaminé em chaminé
Em cima do fogo e do perigo
Chamem outra vez a realidade
A maldita realidade
Quero falar com ela
Quero puxar-lhe pelos cabelos e gritar-lhe aos ouvidos
Que apanhe com a saliva do grito
Que apanhe com a surdez
Com a nudez
Chamem-na outra vez
À realidade fugitiva
Cheia de nicotina
Alcatrão
Palavras
Desejos
Tudo por fazer
Uma casa vermelha fogo no bosque
Café quente de manhã
Sorrisos
Era uma vez um corpo
Com a sua história normal de corpo
Nasceu e morreu
Com um pequeno instante entre o nascimento e a morte
A que muitos chamam vida
Uma viagem entre dois pontos
Que pode ser mais cheia
Que pode ser mais vazia
Que pode ser assim assim
É o corpo
Ou a cabeça
Seja o que for
Seja o que a realidade quiser
Quando corres pela rua
E a chuva te cai na cara
Sabes sempre que a realidade te visita
Se ficas fechado em casa
Protegido do tempo
É a ilusão quem te acompanha
Se a mulher te chega das nuvens
Cai-te nos braços
Deita-te ao chão
Só estás seguro numa prisão
Não olhes para trás
Nunca digas não
Que os fantasmas que não queres ver sempre lá estão
E um dia é tão pequeno como uma mão
Ou um dedo
Ou uma unha
Ou uma vida
Ou uma noite
Já vês as costas
Não tens perdão
Já vês as coisas
Com os olhos no chão
Solta-se o grito
Só dizes que não
Andam as coisas ao contrário
São avarias no cérebro
Aventuras no corpo
Nada te toca
Nem choca
Cabeça oca
Difusa
Di fiúza
Cala-te boca
Que o teu pai morreu
Indo eu a caminho de Viseu
Ai Jesus que lá vou eu
Três vezes eu
Por isso é que te chamam egoísta meu cabrão
Mereces cair redondo no chão
Com textos pacóvios
Sem nenhum palavrão
Pois quem me dera
Ser só amor
Mas as malditas ânsias
Os gritos da guerra
A insatisfação
A penúria
A garganta
O fumo
O ritmo que cresce dentro e que pede para sair
Que é incontrolável
Que é insuportável
Que não consegue ficar
É a cabeça que se coça
São os nervos
As campaínhas
As não-razões
O medo que morreu de velho
Porque envelheceu novo
Avenidas de árvores infantis
Nas quintas distantes
Outono
Tons vermelhos no chão que se pisa
Matéria decomposta origina vida inimaginável
Montanha
Raios de luz por entre as árvores
Uma avenida brilhante e vermelha no meio do nada
Que só os teus olhos comem
Sôfregos
Solitários
Um prazer vazio
Combina-se que não se olha para trás
Mas os olhos nunca olham para a frente
Estão fixos
Palavras inquietas
Um sobressalto constante