sábado, 25 de outubro de 2008
faltarem palavras. palavras que são coisas. acontecimentos. procurar o vago. dormir. ter certezas inquietantes. algo estremece. o que não se lembra existirá ainda? os lugares? as casas? café quente de manhã e folhas para escrever. livros desmaiados. livros inúteis fechados em caixas fechadas num buraco húmido no cimo de um quarto. um quarto imensamente pequeno que estrangula a vida. que vida? não há vida nenhuma. é o estrangular das coisas. não são as coisas que se esquecem. é o eu que se esquece. o eu não se esquece das coisas. esquece-se de si. andar pelas ruas a construir textos na cabeça que nunca serão escritos fora da cabeça. aguentar. o tempo passa. a velocidade torna-se secundária e o corpo vai-se aguentando. perguntam como vai o processo e responde-se que o processo já e um desenvolvimento do próprio processo que não tem a certeza de ter finalidade. é impossível voltar ao zero. nunca se esteve no zero. ainda não se nasceu mas já se tem a corda. primeiro oferecem a corda. depois vão oferecendo outras armas. a vida vai passando com o acumular de armas. chamam idade a esse facto. mergulha-se nos factos com a cabeça incisiva. a cabeça torna-se problemática. ganha um ritmo. ganha amores e ódios. perde amores e ódios. a cabeça é assim. problemática. tenta esquecer-se mas é em vão que tenta. como esquecer-se quando a forma está construída com o problema? pode responder-se a isto com a imagem fácil da cabeça a separar-se do corpo. mas quem quer essa imagem? é demasiado fácil para que possa acontecer. volta-se à rua. tenta respirar-se um pouco de vida. pessoas. informações. um pouco de música. algo de novo. uma imagem que chame. um outro lado. uma realidade. anda-se tanto num registo que já não se sabe o que é a realidade. ou então chega-se à conclusão que a realidade é mesmo esta. é aqui. é este o sítio. é a cabeça mínima e o corpo morto. as pessoas que se escapam porque já não se é o mesmo. porque se perdeu um brilho qualquer que nunca se teve. uma invenção de um brilho. as partículas tornam-se secundárias. a luz vai-se apagando. acumula-se idade. armas. armas contra o desprezo. não se tem amor. tem-se distância. tem-se a vida que constrói impossibilidades. prisões. ar fechado em quartos mínimos. faltas de contactos. aguentar. andar. vestir a máquina e tentar não falhar. tentar não ouvir vozes na cabeça nesse dia que são todos os dias alguns dias. tem-se a certeza de que vai chegar o tempo em que alguém vai ter de decidir alguma coisa e alguma coisa vai morrer no corpo. porque apesar da distância ser mínima não se acredita no regresso nem o regresso é pedido com qualquer convicção de desenvolvimento. anda-se por aqui. de vez em quando rebenta-se e de vez em quando acumula-se. anda-se nos ciclos. problema nenhum.
colocado aqui por
Pedro Fiuza
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1 comentário:
Grande poema, mesmo! :)
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