terça-feira, 17 de novembro de 2009

tinha plena consciência da merda em que me estava a afundar. no meio de uma densa obscuridade esse era o meu único pensamento de clareza sem limites. a afundar-me na merda. com cada vez menos saídas. a frustrar conscientemente os objectivos. como se o meu dever fosse falhar. lá está aqui o sentido do crime que se perpetua por dentro, um crime que é um engano. em pequeno fascinavam-me os golpes, atingiam uma dimensão poética que contrastava com o meu casulo mínimo. sonhei demasiado alto, houve um dia em que as palavras me visitaram com um ritmo nocturno, demasiado tarde, estava contada a história, o fascínio do registo da queda, o documento da queda em tempo real, que é ao mesmo tempo prisão e liberdade. voei demasiado alto na minha noite, no meu quarto, enquanto sonhava amores perdidos, as coisas gigantes da poesia. mas o mundo não tinha poesia, e se a tinha, certamente que não era a que eu queria. uma poesia de outros, tornada lugar absoluto, em que os livros eram objectos mais do que sagrados. era tarde para outras funções, estaria para sempre afastado da norma, era um corpo sem lei. e depois o amor, a expressão maior do mundo, purificado no sangue, atirado às pedras como um ser suicida. lá me ia eu esquecendo de mim enquanto me fechava cada vez mais no meu dentro.

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